terça-feira, 30 de setembro de 2008

Todos os Nomes*

Conheces o nome que te deram, não conheces o nome que tens. Chamava meu relógio Cássio G-Shock de Júpiter, minha régua de aço inox que ninguém no ginásio tinha de Indiana Jones. Meu primeiro bichinho, a gatinha preta assombrosa que comia vagem foi Panterinha, a Petô. Petô, esquisita, deu só uma cria que logo cri macho e acudi por Kepler. Era fêmea, mas Kepler ficou. Depois chamei Bromelga à beagle da avó e do pai (tadinha, foi Paçoquinha no princípio), e segui, já não tão menino, chamando Sofia, Pilar e Carmem às roseiras que o falecido avô me entregou a plantá-las.

Se o nome não muda o doce sabor que outrora em versos te havia dito. Então surgiu o Joaquim Sassa, furão, chamavam-lhe ferret. Joaquim jamais deixou de ser pronunciado, mesmo passados tantos anos de sua morte. E foi por isso, também, que não houve mais bichos, entretanto, para não perder a meninice, inventei de andar de bicicleta e, é claro, meti-lhe nome próprio: Beatrix Kiddo, a noiva magrela.

What's in a name? that which we call a rose by any other name would smell as sweet. Passei desfolhando o último momento e chamando nomes de muitos amores para deixá-los de chamar depois (se me chamaram alguma vez, não escutei). E nestes confusos instantes de nenhuma certeza, ela surge fagueira, risonha e linda bafejando o ar quente e dengoso no meu rosto: é minha, vem morar comigo. Parece simples, sequer preciso chamá-la e ela vem cá. O corpo balança suave, tem graça no andar mesmo inseguro, e nem liga não tenha nome, embora precise de um nome.

Sobejam o carinho e a atenção, e ainda se ambos mudos ela viria, lá como a fosse chamar. Mas é necessário um nome, precisamos, por força, de um nome: vagueio a pronunciar cauteloso: Dafne? Nua? Amaranta? Frieda? Tulipa? Virgínia? Não sei, ai meudeus, in nomine dei, não sei, não sei. Ela segunda-feira chegou e hoje, já terça, sem nome não podemos estar. Quem idéia tiver (que seja nome, alcunha, apelido, hipocorístico ou pseudônimo) favor enviar o mais depressa possível ao endereço que mais rápido se escreva pois ela precisa ser batizada. Afinal, o tempo não cessa e já tendo eu o meu próprio, espero ansioso o de minha companheira no eminente esquecimento. Duas vezes se morre: primeiro na carne, depois no nome.

* - o título é furto ou plágio de José Saramago, do romance homônimo.

terça-feira, 16 de setembro de 2008

Espinosa e a hera dos pitacos

Há um mês, de férias, resolvi cortar a hera do muro da casa de mamãe. Trabalho árduo e extenuante, para gente forte e alongada. Portanto, para mim. Comprei lá uns utensílios de jardinagem, de jardinagem pesada. Preocupou-me inclusive desconfiassem fosse o loirinho dos olhos claros esquartejar alguém (apesar de ser forte e consistente muscularmente, não sou robusto ao ponto de parecer, inclusive na coloração da minha cutes, que ganho a vida cortando a facão e enxadão plantas ao sol do meio-dia). Comprei luvas também, não queria as mãos machucadas. Apesar de não atrapalharem ao tocar a valsa brilhante, poxa, calos doem.

Foi divertido demais. O sol é uma benção no inverno brasileiro. Arde miudinho e o céu fica de um azul maravilhoso. Aproveitar as férias sentindo o cheiro de mato, vendo as pessoas nos carros apressadas, as senhoras que saem à rua para apanhar um pouco de ar, os cães, os pássaros, a molecada jogando bola... Tudo animador, sorridente. Eu cortava a hera sem esforço demasiado, satisfeito de fazer um movimento matutino sem compromisso com horários, e me sentindo útil no trabalho manual que ia executando.

Cacei um chapéu de festa junina que fora da minha irmã. Tirei as rendas e as trancinhas negras, ficou jóia. Na lide acabei encontrando um ninho de passarinho! Ah, que coisa mais linda as duas pequeninas avezinhas... Caros leitores, eu menti. A felicidade descrita no poste anterior é cerca de treze e meio por cento menor do que o propalado no último índice. Ora, me perdoem. Ai amores, não briguem, não me castiguem, ai digam que me amam e eu não minto mais. Na verdade não chega a ser uma mentira, mas talvez um exagero ao descrever a situação. Não eram todos os poros que exalavam felicidade. Creio que só as apócrinas (alguém aí sabe se alegria tem cheiro?). Então é isso. Apesar de tudo, não sei se vou poder falar apenas de passarinhos aqui na Bazófia (sinto dizer, a história da hera era [te peguei, Elcio] uma idéia que me ocorreu de falar do sol e das belezas singelas na vida do simples homem. Eu nunca encostei sequer numa tesoura em minha vida toda. Os passarinhos não existem a historieta do começo não tem fim).

Estou com um problema que gostaria de compartilhar com vocês (na verdade são dois, pois queria escrever sobre Espinosa e fiquei com vergonha, já que a Jú Pacheco entende muito do assunto. Mas deixa isso pra lá, também não vou falar aqui do meu complexo por ter as canelas finas...). O problema é o seguinte: quero mudar o sistema de responder aos pitacos. Do jeito que é, quem entra na página lê lá quem tem x pitacos. Mas na verdade, como eu respondo um a um individualmente e o blogger conta os meus como se fossem os de um visitante da página, então os pitacos de fato são x/2. Acho isso um saco, propaganda enganosa. A Veridiana, sempre ela, achou maneira de melhorar a coisa, fazendo com que eu possa responder em itálico ou outro gracejo que diferencie - embaixo do comentário original - a minha resposta, sem contar como um pitaco a mais. Mas tem um problema: é uma ferramenta de um outro site e ao acoplá-la (usando um termo interessante que não é da informática, creio, acho que caiu bem) à minha página, os pitacos, todos, anteriores desaparecerão!

Normalmente eu faria o que me desse na telha, porque sou meio folgado e o blogue é meu. Mas como os comentários são parte integrante desta brincadeira toda, e como são, muitas vezes, muito mais interessantes do que os próprios textos e, sobretudo, foram escritos por vocês, leitores, não tenho coragem de simplesmente desaparecer com eles daqui. Que faço? Alguém tem alguma sugestão? Será que o custo da ação não vale o benefício? Ficava muito feliz de alguém me dar uma luz sobre o assunto.

Bom, já está chegando meia-noite, preciso postar ainda na terça. Semana que vem comento sobre as segundas. Haverá entrevistas.

terça-feira, 9 de setembro de 2008

Bazô

Voltei para a Bazófia. A Bazófia voltou. E por que voltei para a Bazófia voltou? Pelo motivo diametralmente oposto do abandono anterior: a felicidade. Estou feliz. Estou alegre. Estou rindo á toa. E com vontade de escrever, de escancarar essa alegria que parece vir de fora e se misturar com uma que já está cá dentro, causando um congestionamento por todos os meus poros, como se eu pudesse estourar de contentamento. Ei, esperem! Há motivos. Os há vários. Conto. Eu conto. Enumero, a seguir, algumas das razões do eflúvio sorridente de bonança:

a) Dinheiro. O serviço assoma de tanta paga. Cresço, não estou ficando rico, mas poderei em breve passar quinze dias na Europa sem esforço. Além disso, uma quantia que estava encalacrada em burocracias mil resolveu adejar minha conta bancária. Ora, que faço? Compro um carrão, novo, brilhante, feroz.
b) A saúde. Não me lembro de sentir-me tão bem nem quando tinha quinze anos, idade em que só as espinhas é que faziam feio. Meu organismo parece o de um urso, e sequer uma gripe posso apanhar.
c) As relações familiares. Aproximei-me sobremaneira de meus entes querido. Os diálogos agora fluem, vemos-nos sempre, sempre, com alegria dividimos almoços, jantares, faina vária. Já a liberdade de confidenciar cada probleminha por menor que seja faz a cumplicidade expandir-se em afetos trocados, abraços e beijos macios.
d) A formação acadêmica. Finalmente pude regressar a estudos perdidos para trás, amarelados nos livros guardados. E agora vou de vento em popa correr atrás de conhecimento formal que me trará títulos e quem sabe medalhas.
e) O amor. Bem, é verdade que o grande amor ainda não apareceu, mas sei que está aí na esquina. Se calhar já me espreita por detrás de alguma árvore. Com tudo caminhando assim tão bem, estou bonito e a minha pele parece mais jovem, de modo que demora quase nada e a mulher mais incrível do mundo me abraçará logo amanhã.

Então, é isso. Por que entristecer-me com ipês-rosa se a árvore do quintal da minha casa dá as flores brancas mais lindas de setembro? Tudo me parece tão claro, tão languidamente dourado... E por isso eu volto a escrever. Para despejar palavras insensatas de tamanha alegria nesta Bazófia que agora queria se chamar Bazofinha, Zozó, Bazô ou qualquer outro nome menos sisudo para dar cara à face do signatário que não cabe em si diante das cores da vida. É melhor ser alegre que ser triste, a alegria é a melhor coisa que existe, é assim como uma luz no coração. É sempre bom lembrar que um copo vazio está cheio de ar.

A Bazô volta então para falar de alegria, de olimpíadas, de flores, de crianças, enquetes, as diferentes maneiras de fazer amigos, cem dicas de beijos e abraços, dos shows da Ivete Sangalo. Nada mais de solidão, praças frias, acidentes automobilísticos ou perdas doloridas. As personagens estão já mudadas e agora sorriem, divertem-se e enxergam a bondade e a beleza do simples homem.