terça-feira, 6 de novembro de 2007

A morte do pica-pau

(clicando-se no título deste post, chega-se à "As flores de plástico")
Existe época de aves? Digo, assim como época de morango, florada de azaléia e assim por diante? Eu prometo que não sei, mas poderia bater o pé e fazer preces de que estamos na época dos pica-paus. Só assim eu poderia conceber que tenha visto tantos deles por aí, numa profusão que transcende em muito o comum de olhar e ver pica-paus.

Mesmo agora quando saí para a corridinha do fim de tarde foram três! Note bem, estou falando de três pica-paus! Em área urbana, ainda que bastante arborizada. Supondo que dois formavam o casal, quem era o terceiro? O filho? Muito crescido para ainda ter com os pais. O amante? Bom, não sou ornitólogo e desconheço os costumes sexuais dessas aves.

Fiquei percebendo que a primeira idéia, meio platônica por assim dizer, que me surge à mente quando penso em pica-pau é o da Universal Estúdios, criado pelo Walter Lantz na década de quarenta. Bem, nada mais diferente do que o nosso pica-pau tupiniquim, que muitas vezes tem um ventre amarelo de plumagens que vão até ao pescoço, envolvendo-lhe pelo dorso que tromba, por fim, no indefectível topete vermelho, este sim, inconfundível. O pica-pau do desenho animado todo mundo sabe como é, e pica-pau azul claro todo mundo também sabe que não existe (para não falar do bico ama

Este texto queda-se aqui. Isto não é Kafka e nem pretende, mas vou arriscar, como se estivesse frente a frente com quem me lê, em conversa grave. Não vejo mais sentido agora em falar de pica-paus. Acabo de saber da morte de duas irmãs gêmeas, em acidente na estrada que liga Bueno de Andrade à minha Araraquara. Vinte e um anos. Parece-me perderam o controle do veículo. Eu não sei exatamente o que pensar sobre isso, mas me chocou. Chocaria a qualquer um? Morreram oito pessoas no acidente com o Learjet em São Paulo, são mortes menos chocantes? Há como valorar isso? Eu não conhecia as meninas que morreram, mas será que a proximidade geográfica, o fato de eu mesmo passar com alguma freqüência pela estrada em questão são ingredientes para me comover mais? Repito, eu não sei.

O que sei é que Sêneca tem razão, que Hamlet tem razão e que Larkin tem razão. Manuel Bandeira tem razão, pois a vida é uma agitação feroz e sem finalidade. Muitos outros ainda têm razão. Quem não tem razão sou eu: minha única sorte é não acreditar em deus e não ter que me revoltar com ele, não acreditar em destino e não ter que com ele me preocupar. A estupidez da vida é algo tão latente que não consigo sequer pensar em filosofias. Seria culpa de ter uma percepção demasiado acentuada do caráter transitório da vida? Seria problema com neurotransmissores? Seria fingimento de quem não tem opinião, e tem medo? Eu não sei. Sei apenas que a morte, surda, caminha ao lado. Afinal, como notaram as minhas flores de plástico: "(...) a percepção arrastada ao longo dos séculos de que afinal, à morte, ninguém pode fazer esperar eternamente, corroborando com isso o príncipe hamlet, que muito anteriormente havia dito que se não sabemos nada daquilo que aqui deixamos, que nos importa deixa-lo antes?

p.s. – escusado dizer que o título do texto não seria este, e que o texto, mesmo, também não seria. Mas absolutamente perdi o fio da meada e não consegui retomar o argumento das aves de topete vermelho. Deu no que deu, só posso pedir desculpas, ainda que melhor seria não tê-lo publicado.

13 Pitacos:

Anônimo disse...

Do alto de sua árvore, o pica-pau deve se apiedar de nós, não acha?

Anônimo disse...

Não sei a que pés andaria o texto sobre os pica-paus, mas acredito que se trataria de algo mais colorido, não? Acho que justamente por isso a quebra dessa cor deu tão certo, fazendo com que suas questões fizessem ainda mais sentido nessa busca de sentido. Digo isso comentando a falência do texto inicial(seria mesmo isso?), causada pelo impacto de um acontecimento, que acabou resultando em outra coisa, ainda intimamente relacionada com a primeira.

Fiquei pensando em Manuel Bandeira, na Preparação para a Morte, e também na vida que nos afeiçoa, nos prende e é bonita em cores e topetes de pica-pau. Mas ela insiste em ser cruel.

Tatiana Machado disse...

A n�o ser que seja recurso ret�rico, n�o vejo porqu� deva se desculpar pela publica�o do texto. Para quem planeja a publica�o de textos em formatos diversos, para testar-se (e a seu p�blico tamb�m?), fico imaginando que n�o seja gratuita a publica�o de um texto incompleto, acompanhada de exposi�o do porque o mesmo foi interrompido.
Pouco se pode dizer do texto sobre pica-paus, pois acabou cedo demais. Mas parece-me interessante que ele apresente uma compara�o est�tica (e quem sabe chegaria a mais) dos pica-paus de verdade, que se encontram por a� tupiniquins, nossos, com os p�ssaros da fantasia, do desenho animado, da nossa inf�ncia.
E ent�o, queda-se o texto. E o paralelismo fica evidente. Da reflex�o sobre objetos da fantasia, do fantasiar que � a pr�pria constru�o do texto ficcional, parte-se para o concreto-sem-sentido-da-vida. Mas, aqui nessas suas reflex�es, ser� mesmo a vida, essa que permite a fantasia, o pensar sobre, o interromper e recome�ar e refletir sobre tudo isso, ser� ela o sem sentido ou a ser� a morte? A morte das meninas interrompe, momentaneamente, a vontade e a capacidade para a fantasia. Mas as reflex�es expressas em forma de inquieta�es a respeito da vida, da morte e dessas mortes em especial, j� se transformam novamente em vida. O t�tulo da postagem � preciso: a morte do pica-pau. Mas a sua publica�o no blogue � j� o recome�o. Recome�o do uso da imagina�o criativa, da vida, portanto.
Escusado dizer que, toda essa divaga�o, � a MINHA leitura do que voc� escreveu.

Unknown disse...

Pelo menos as minhas dúvidas com as aves em questão são tão grandes quanto as que tenho em relação à morte...
Não acredito, portanto, que houve qualquer tipo de "quebra" de assunto neste texto. São dois extremos, obviamente, mas dois extremos que nos levam a devaneios igualmente misteriosos.

Bjoss

Anônimo disse...

E ai rapaz! Ta gastando a lima das palavras com a faca de idéias! Afiado, como sempre!

Mas escrevo mesmo pra te dizer que já conhece o caminho e pode voltar, está bem! Venha e traga os seus! Façamos um 'almoço de blogueiros', ou o que estiver afim, meu caro!
Abraço!
Touso!

Anônimo disse...

Para a peste de pica-paus, só temos duas opções: ou é resultado da globalização ou do aquecimento global. Huahau

PS: Façamos sim o almoço dos blogueiros!

Alessandra Motta disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anônimo disse...

Eu não acho nada, Carol. Mas se sente pena a ave, a pena é mútua, porque o destino só diverge no que tem de consciência de divergir.

Anônimo disse...

Lívia, sem dúvida que havia um texto inicial. Mas depois disso é proposital as rupturas, vez que eu poderia simplesmente contar que ia escrever um texto sobre pica-paus já escrevendo o texto sobre a morte que deu azo à interrupção do tal texto.

Mas melhor do que tudo isso é, realmente, nos lembrarmos dos dois poemas do Bandeira que você cita, maravilhosos e excelentes parar falar do que eu quis falar e não consegui.

Anônimo disse...

Tatiana, realmente foi uma opção estética toda a forma do texto.

Sua leitura do que eu escrevi é a sua leitura do que eu escrevi, e achei muito boa. Eu mesmo fiz uma parecida depois, como leitor do que eu escrevi.

Anônimo disse...

Mazinha, também é uma possibilidade de leitura a sua. E também é possível que se possa entrever "uma só coisa nos dois textos". Mas do ponto de vista de opção formal, realmente eu queria quebrar o texto como se fossem duas histórias que não se juntam.

Anônimo disse...

Touso, um sempre muito obrigado pelas palavras e pelos convites.

abraço

Anônimo disse...

O aquecimento global é uma mentira contada bem alto, e os pica-paus, também. Eba!
abraço